A festa do Santíssimo Crucifixo de Monreale

 Escrever sobre a Festa do Santíssimo Crucifixo de Monreale não é uma tarefa simples, envolve tradição de séculos, fé e amor, é como falar da alma da cidade.
Tive o privilégio de ver de perto toda esta devoção, é um sentimento muito forte que me envolveu totalmente como se eu já tivesse vivido aquilo muitas vezes.
A festa me chamou tanto a atenção que no ano de 2012 "portei o Crucifixo" além mar, numa mostra fotográfica na Argentina e posteriormente  no evento anual "Mia cara Curitiba" realizado pelo Consulado Italiano em parceria com a prefeitura de Curitiba.
Fiz um resumo do que acontece nestes primeiros dias de Maio na pequena e linda cidade de Monreale. As fotos fiz durante a procissão de 2009.


"Todos os anos, no dia 3 de maio, Monreale presta homenagem ao seu “Patruzzu Amurusu”, ou seja, “Patrono amoroso”.Trata-se de um ritual que se repete  há 393 anos. Este remonta ao ano de 1626 quando a festa do Santíssimo Crucifixo foi celebrada pela primeira vez por vontade do então arcebispo Girolamo Venero : um homem que empenhou-se  para acabar com a peste de 1625, que também ali fez muitas vítimas. Todo o resto vem da imaginação popular, que na verdade fez com que a devoção dos monrealenses, já muito bem estabelecida, se tornasse total e  incondicional.
A lenda e a história do SS. Crucifixo são bem diferentes. A lenda conta que em torno de 1540, no Mediterrâneo, navegavam dois navios: um com cristãos das vizinhanças de Palermo, Monreale, Boccadifalco e de Altarello di Baida, o outro era um navio turco. Dizem que os turcos tinham um Crucifixo que tratavam de modo muito irreverente. Os marinheiros palermitanos, escandalizados, decidiram resgatá-lo em troca de uma grande soma em dinheiro.
 Retornando ao porto de Palermo surgiu entre eles a questão: a quem pertencia o Crucifixo. Com o intuito de resolver tal questão, aqueles homens decidiram colocá-lo sobre um carro de bois, sem que ninguém os guiasse e onde iriam parar seria erguida uma igreja que abrigaria o Crucifixo. Assim os bois seguiram para Monreale e pararam onde hoje é a Igreja do Santíssimo Salvador ou “Collegiata” e de lá não se moveram mais.


A história, entretanto, é outra: em torno de 1400, construiu-se a pequena igreja  do Santíssimo Salvador sede da fraternidade homônima. Mais tarde, esta igreja, tornou-se a sede do Colégio dos Cânones, fundado pelo Monsenhor Venero e por este motivo é chamada “Collegiata”. Foi o Monsenhor Venero, então arcebispo de Monreale, a encomendar o SS Crucifixo à família Gagini, que naquele tempo era famosa em toda a Sicília.
A confirmação da história dá-se pelo professor Angelo Cristaudo que restaurou o Crucifixo depois de um incêndio ocorrido em 1º março de 1985. O mesmo já havia restaurado o Crucifixo de Assoro (Sicilia) cujo autor é Antonello Gagini  e percebeu que entre os dois havia uma grande semelhança. Ressaltando também que eram feitos dos mesmos materiais.
A festa na realidade desenvolve-se  durante os três primeiros dias do mês de maio, sendo os dois primeiros dedicados exclusivamente ao folclore, desfiles e concertos musicais. Mas o momento mais importante e que traz à Monreale milhares de devotos de todas as partes da Sicília, e também de outras regiões da Itália, é o dia da procissão, 3 de maio, que se prolonga por mais de 9 horas de extenuante itinerário pelas ruas da cidade,  pelos “fratelli” da Irmandade do Santíssimo Crucifixo . Há uma  multidão de fiéis que os acompanha, muitas vezes com os pés descalços, seguindo a cruz. Começando com a tradicional “discesa a spalla”,  colocado no andor que levará o pesado crucifixo pelos íngremes degraus  do lado de fora  da igreja. Aí se encontra o maior painel de cerâmica “faiança” da Itália, que representa o próprio crucifixo e ali será venerado pelos fiéis e beijado pelas crianças.
Alguns “fratelli” carregam quatro grandes coroas de flores que adornarão os lados do andor que é transportado nos ombros de 40 homens pertencentes à irmandade do Santíssimo Crucifixo. O privilégio é hereditário e teve início em 1709.
Eles se vestem de maneira peculiar há  mais de um século: um lenço branco cobre a cabeça, calça e camisa branca com uma fita vermelha na cintura que segura um lenço branco onde está bordada a imagem do SS Crucifixo. Os sapatos são facultativos, mas devem ser obrigatoriamente brancos. O branco simboliza a pureza que deve se aproximar de Cristo e o vermelho, simbolo do amor e do sangue derramado na cruz.
Às 18h, o som de um sino anuncia o início da longa procissão, pelas ruas da cidade. À frente da procissão seguem a banda musical e os estandartes das irmandades extintas, acompanhados sempre por uma ou outra invocação de um dos “fratelli”. Ao final o “fratello” “responsável pela invocação grita: “ Grazia Patruzzu Amurusu” e todos os outros em coro respondem “ Grazia”.
Com a chegada da procissão à praça central, em frente ao Palácio da Cidade (prefeitura) é à hora da tradicional homenagem: estandartes se inclinam e então se procede a queima de fogos de artifício. Já de madrugada, quando o crocifisso retorna para a Igreja, as flores que o adornaram são levadas pelo povo, pois, segundo a tradição popular, estas flores protegeriam contra desgraças e doenças."














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